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Reportagem

'O plano é bom', diz CEO: Gol corre contra o tempo para sair da recuperação

Gol está prestes a concluir um dos capítulos mais delicados da sua trajetória. Desde janeiro de 2024 sob o regime do Chapter 11 nos EUA (similar à recuperação judicial no Brasil), a companhia aérea afirma ter finalizado as fases mais críticas do processo de reestruturação.

Foram realizadas renegociações de contratos e reorganização da frota, entre outras iniciativas. O desafio agora, segundo o CEO (presidente-executivo) Celso Ferrer, é concluir a captação de US$ 1,9 bilhão, necessária para a saída definitiva da recuperação judicial nos Estados Unidos.

"O plano é bom. O nosso plano é bom. Então vai ter que se provar", disse Ferrer durante o Conexão Gol, encontro com jornalistas promovido pela empresa nos hangares da empresa no aeroporto de Confins (MG) nesta semana.

Meta bilionária

A empresa tem a meta de garantir junto a investidores US$ 1,9 bilhão (R$ 5,6 bilhões) para sair do processo de chapter 11. Ferrer explicou que a empresa já fez acordos com investidores no valor de US$ 1,25 bilhão, mas que esse valor não é suficiente para validar o plano.

"O que falta agora é preencher essa estrutura. Quem são os nomes que vão preenchê-la? Tanto do lado do equity, do capital, quanto do lado da dívida?", diz o executivo.

Mesmo com US$ 1,25 bilhão, sem os US$ 650 milhões restantes não será possível sair da recuperação. Esta é a última etapa do plano, mas há preocupação em como conseguir captar o valor restante diante das incertezas do mercado financeiro.

As últimas ações do presidente Donald Trump (EUA) e a volatilidade do dólar trouxeram uma forte instabilidade para a economia, e os investidores passaram a se fechar aguardando momentos de maior previsibilidade. A meta, ainda assim, é mantida para até o dia 15 de maio para concluir os financiamentos e garantir a saída da recuperação até o mês de junho.

A empresa já tinha tentado concluir essa operação em dezembro de 2024, mas a volatilidade cambial impediu o fechamento. "Foi aquele rali do dólar, naquele momento", disse o executivo, que acredita que, se os próximos dias forem bons no mercado, a empresa estará pronta para a saída da crise.

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Frota menor, mas mais estável

Durante o processo, a Gol decidiu reduzir a quantidade de voos para manter a regularidade de suas operações. "A gente falou: vamos planejar a companhia para um tamanho menor, quase o menor possível naquele momento, de fevereiro, março, abril do ano passado, bem estável, pra garantir que qualquer negociação que a gente estivesse tendo com os donos das aeronaves não impactaria a nossa operação", diz Ferrer.

Hoje, com o avanço da reorganização, a empresa voltou a crescer, afirma o CEO. "Saímos desse platô de 500 e poucos voos para 650 por dia agora e, daí pra frente, crescendo", diz Ferrer.

A estratégia também envolveu mudar o perfil da malha. "Hoje, a companhia está com um portfólio de voos mais diversificado, que a gente chama da etapa média da companhia, que é a quilometragem média [de cada voo]. Ela era de menos de mil quilômetros na época dos mil voos diários [antes da crise]. Hoje a gente tem uma operação forte no Sudeste, mas a gente tem toda a expansão internacional, que são voos de 8 horas, 7 horas, 5 horas de duração. Então nossa etapa média hoje está muito mais próxima a 1.250 quilômetros" explica o executivo.

Motor é gargalo

Um dos maiores entraves operacionais ainda é a demora para manutenção de motores, que mais do que dobrou desde a pandemia, segundo a Gol. "Antes a gente tinha um tempo de tirar o motor da asa, mandar pra oficina e voltar, de 90 a 100 dias no máximo. Hoje isso demora 180 a 200 dias, por conta de todos esses problemas de cadeia de suprimento que a gente tem no mundo", diz Ferrer.

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Atualmente, 11 aeronaves seguem em condição de preservação, ou seja, paradas sem voar. "O plano prevê que, no primeiro trimestre do ano que vem, não tenha mais nenhum avião nessa condição de preservação", diz Ferrer. Apenas durante 2024, 12 aviões foram devolvidos para os seus donos como parte da reestruturação da companhia.

Ferrer também rebateu com firmeza qualquer sugestão de risco à segurança operacional. "Você não vai encontrar nenhum registro aqui dentro, nada, nenhuma evidência de que tenha sido despachado um voo em alguma questão que não esteja relacionada à segurança. [...] Ou ele tem ciclos para voar e está bem para voar, ou seja, está aeronavegável, ou ele não está", afirmou o executivo.

Codeshare e mercado regulado

Ao comentar o acordo de codeshare com a Azul, Ferrer afirmou que a parceria está limitada a rotas onde as empresas não concorrem diretamente. "O codeshare que a gente tem com a Azul é de rotas não sobrepostas", destacou Ferrer, rebatendo acusações de que estariam agindo de maneira a adiantar uma possível fusão, que ainda está em debate.

Ele também negou qualquer relação entre o codeshare com a Azul e o aumento de tarifas em algumas rotas. "A Gol é um canal a mais de vendas para aquele voo da Azul. Ela já voava sozinha e continua voando sozinha [naqueles trechos]. [...] Nesse momento, eu não vejo como ter relação de causa e consequência de preço com o codeshare", afirma Ferrer.

O executivo reforçou que todas as interações com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) seguem dentro da legalidade.

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Fusão com Azul congelada

O memorando de entendimento (MoU) assinado com a Azul e a holding Abra, que controla a Gol, suspende qualquer movimento de fusão durante o Chapter 11, lembrou Ferrer. "A Abra deu publicidade a esse memorando pra dizer para o mercado: não há possibilidade de mexer com a Azul e a Gol enquanto a Gol estiver nesse processo do Chapter 11. Não há", diz Ferrer.

O executivo fez questão de afastar qualquer especulação nesse sentido. "Não é intenção nenhuma [de adiantar os negócios], e o memorando veio justamente pra esclarecer isso", afirma. Segundo ele, o plano de recuperação atual precisa se sustentar sozinho, independentemente da perspectiva de fusão com a Azul: "Tem que ser um plano sustentável. Não pode ser uma coisa que eu fale: 'Ah, eu estou fazendo isso hoje, mas, na verdade, a intenção é, daqui pra frente, fazer uma fusão no ano que vem'. Não é".

Próximos passos até junho

Com boa parte da estrutura financeira definida, o foco da Gol está agora em fechar a captação completa até 15 de maio. "Se tudo ocorrer até o dia 15 de maio, não vejo mudança na nossa saída do Chapter 11", afirmou o executivo.

A empresa já iniciou conversas com investidores desde outubro e está com todos os documentos prontos para executar o financiamento assim que a janela de mercado for considerada favorável: "A gente continua mirando [nessa saída] — isso tudo foi feito justamente pra dar um espaço pra gente achar essa janela, a melhor janela pra emissão dessa dívida".

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Como a crise começou

A Gol entrou no Chapter 11 em 25 de janeiro de 2024, pressionada por uma combinação de fatores: desvalorização cambial, aumento de custos operacionais, gargalos na manutenção de motores e dificuldades para honrar compromissos com arrendadores e fornecedores.

Desde então, renegociou contratos com os lessores, fornecedores estratégicos e com a própria Boeing, além de reduzir sua frota ativa e reorganizar sua malha de voos. A previsão da empresa é concluir a reestruturação e sair oficialmente do processo até junho de 2025.

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